18 de jun. de 2013

Que lugar a política deve ocupar na Igreja?


Por Davi Lago

Jesus não veio como um libertador político ou reformador social. Jesus veio ao mundo para salvar pecadores. Perante Pilatos, Cristo afirmou: “O meu Reino não é deste mundo” (Jo 18.36).
Dado que o maior problema do mundo é espiritual, e não político, a igreja tem uma missão espiritual. Devemos entender que os resultados espirituais que queremos ver na sociedade só podem ser alcançados através de meios espirituais. Por exemplo: uma genuína reforma moral nunca virá através de mudanças na lei, mas através de mudanças nos corações e mentes das pessoas.
Não adianta estabelecer leis que obriguem as pessoas a viverem como cristãs, pois só a obra do Espírito Santo pode promover essa transformação. Dessa forma, a maior potência do mundo não é nenhum protesto político, mas a proclamação do evangelho de Cristo, pois só ele é “poder para a salvação” (Rm 1.16).
É interessante notar que os primeiros cristãos viveram sob um governo muito mais opressivo do que os sistemas políticos de nosso tempo, e jamais tentaram formar um partido político, ou mesmo alterar as leis romanas imorais. Pelo contrário, eles “pregavam a palavra por onde quer que fossem” (At 8.4).
O maior bem temporal que possamos realizar neste mundo através de uma participação política não se pode comparar com o que o Senhor pode realizar através de nós no trabalho de seu reino eterno. Assim como Deus chamou o antigo Israel, ele convocou a igreja a ser um reino de sacerdotes e não um reino de ativistas políticos (1Pe 2.9).
Portanto, deve ficar claro que a missão da igreja jamais foi causar uma reforma política no mundo, mas sim, uma reforma espiritual. Cabe aqui a história de um cristão que estava sentado ao lado de um político. Um mendigo passou na frente deles. O político disse: “o meu programa político pode dar roupas novas para aquele homem”. E o cristão respondeu: “O meu Jesus pode colocar um homem novo naquelas roupas velhas”.


A responsabilidade política do cristão

Embora a igreja não tenha uma agenda política, cada cristão pode e deve se envolver na arena política como indivíduo. O teólogo John Stott afirma que os cristãos devem evitar os dois erros opostos, o do laissez-faire (não fazer nenhuma contribuição ao bem-estar político da nação) e o da imposição (procurar um ponto de vista minoritário a uma maioria que não o queira, como no caso das leis antialcoolismo nos Estados Unidos, no período do proibicionismo). Em vez disso, deve se lembrar que de que a participação política é importante e a democracia significa governar com o consentimento dos governados, que o “consentimento” é questão da opinião pública majoritária e que a opinião pública é uma coisa volátil, que está aberta à influência cristã. O cristão deve salgar a política[1].
Todos os cristãos individualmente podem ser politicamente ativos. Todo cristão deve ser o “sal da terra”. O cristão precisa estar no mundo para que sua influência possa ser sentida. Por isso é fundamental que todo crente esteja inteirado dos assuntos políticos, conscientizado dos problemas sociais, atento às atividades dos políticos que ajudou a eleger, etc. Paulo escreveu a Tito: “Lembre a todos que se sujeitem aos governantes e às autoridades, sejam obedientes, estejam sempre prontos a fazer tudo o que é bom, não caluniem ninguém, sejam pacíficos, amáveis e mostrem sempre verdadeira mansidão para com todos os homens” (Tt 3.1-2). O cristão deve estar pronto a fazer tudo o que é bom e buscar o bem de todos os homens. Esta é justamente a missão da política: lutar pelo bem de todas as pessoas.

Exemplos históricos de influência política positiva dos cristãos

Podemos citar duas conquistas políticas muito importantes que foram frutos diretos da influência de cristãs no âmbito político: a abolição da escravatura na Inglaterra e o fim da segregação racial nos Estados Unidos.

1. A abolição da escravatura no período moderno foi resultado da luta política do estadista cristão William Wilberforce na Inglaterra. Wilberforce foi um crente devoto e político exemplar que trabalhou incansavelmente para impedir o comércio de escravos da África para as Índias Ocidentais. Após vinte anos de labuta, o parlamento inglês finalmente aprovou seu projeto de lei para deter o comércio de escravos. Em seguida, ele trabalhou, por mais de 25 anos, para libertar os escravos dos territórios ingleses. Após o esforço de Wilberforce, o parlamento libertou os 700 mil escravos ingleses remanescentes.

2. A conquista dos direitos civis para os negros foi uma grande conquista na História dos Estados Unidos, que repercutiu na política mundial. Essa vitória foi resultado da atuação política do pastor batista Martin Luther King Jr. Ele que liderou o movimento social que lutou contra a segregação racial. A atividade de Martin Luther King Jr. foi inspirada no evangelho e deu resultados positivos.

É válido salientar que tanto a remoção da escravatura na Inglaterra, quanto o estabelecimento dos direitos civis para os negros nos Estados Unidos, não foram fenômenos novos dentro do cristianismo. Como afirma Alvin J. Schmidt, “ambas as conquistas já eram práticas existentes dentro da igreja cristã desde seus primórdios”[2].





[1] STOTT, John. Cristianismo autêntico. São Paulo: Vida, 2006, p.479.
[2] SHIMIDT, Alvin J. How Christianity changed the world. Grand Rapids, Mich.: Zodervan, 2001, p.290.